Lá vem Maria

A Pedra

abr 22, 2016 por

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Um ônibus, dois ônibus, infinitos ônibus.
Lotados, apinhados.
A fila serpenteia, o menino passa a pedra, a pedra destroça o menino, que enfrenta o homem, que assume sua sina.

O ônibus, a fila, o menino, a pedra, o homem, a sina que já foi destino.
É tarde. Não há sentido algum.
Ainda que pudesse dizer que trago em mim o amor de muitas vidas,
do lado de fora a pedra destroça o menino, que enfrenta o homem, que cumpre a cega sina.

Nada tem sentido. Nenhuma norma satisfaz.
Qualquer convenção é minuscula a julgar o amor de muitas vidas que trago em mim.
Mas logo depois de minha sombra está o ônibus e a fila, a pedra e o menino, o homem e sua triste sina.

Um ônibus, dois ônibus, infinitos ônibus.
Vazios, desocupados.
Na rua desimpedida, o vento passeia, o menino amortece a dor, o homem carrega o menino, que enlaça o homem, que destroça a pedra, assumindo seu destino.

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A Febre e o Amor que vieram de Recife

abr 20, 2016 por

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No último dia do Festival de Teatro de Curitiba de 2016, numa das salas do Solar do Barão, o diretor de “Febre que me segue” encerrou suas considerações aos atores com uma frase mais ou menos assim: “façam tudo com muito amor, porque é de amor que esse espetáculo fala.” E foi exatamente o que tivemos.
Logo depois a porta da sala foi aberta e o público acolhido pelo grupo. A troca afetiva e respeitosa atravessou o espetáculo. Do inicio ao fim, espectadores e atores estiveram envolvidos numa experiência que transcende o intelecto e atinge sutilmente o emocional.
Este é um dos fios que amarra a peça de teatro que o grupo Máquina dos Sonhos trouxe de Recife. A dramaturgia é sustentada por uma história corriqueira, de um rapaz e suas emoções, mas a narrativa não linear a faz especial e universal. A metalinguagem, com uso pontual e preciso, é mais um dos recursos que a enriquece.
Wellington Júnior deu ao espetáculo uma direção arrojada e corajosa, sem que, em nenhum momento, escorregue para algo constrangedor. É um espetáculo intimista e também neste aspecto, não há invasão, mas respeito. É provocativo, mas a provocação tem ares de convite para vivenciar o que acontece no mundo invisível do outro de quem é diferente ou semelhante.
Muitos são os atores que encarnam o personagem e o corpo, mais que a fala, é instrumento de comunicação dos afetos, desejos e conflitos. O recurso, associado ao limite tênue entre plateia e palco e a penumbra esfumaçada, permitem a universalização, a empatia e a identificação com as emoções expressas.
Dias antes conversei com as atrizes Natalia Cozzan, Sabrina França, Shirley Caroline sobre a experiencia do grupo e arrisco dizer que a direção de Wellington Júnior fez laço com as pesquisas do grupo.
O espetáculo trata de amor, mas também de desejos e conflitos. E não o faz de maneira discursiva, mas vivencial e transformadora. Sou grata pela experiência vivida e pela acolhimento que veio de Recife.

Atores: Luiz Carlos Filho, Rodrigo Herminio, Yto Soares, Paulo Cesar Pereira, Diogo Fernandes, Elisa Nascimento, Karol Soares, Li Buarque, Jávila, Nayara Lane, Thiago Santos, Melissa Frazen, Natália Cozzan, Sabrina França, Shirley Caroline.
Direção: Wellington Júnior.
Companhia: Máquina de Sonhos Cia de Teatro

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O Segundo Mandamento

abr 19, 2016 por

A votação ainda estava acontecendo, mas as charges e piadas relacionadas já inundavam as mídias sociais. Creio que é pertinente afirmar que esse humor ácido foi a forma encontrada pelos brasileiros para extravasar a indignação provocada o circo de horrores da Câmara Federal, do dia 17 de abril de 2016.
Nós tivemos um revés. Dependendo do curso da história e, o Senado indica essa possibilidade, o revés pode se transformar em derrota.
Nós, no caso, não faz referencia direta ao PT, ao PCdoB, ao PDT ou a esquerda brasileira em geral. O pronome representa trabalhadores rurais, comerciais e industriais.  Indica pequenos agricultores,  prestadores de serviço,  microempreendedores individuais,  profissionais liberais que não atendem aos mais ricos,  profissionais da cultura e da educação. Está representando os Sem Terra, Sem Teto e outros tantos que não participam da divisão do bolo.
Mas, mesmo consciente dos riscos, não esperem ver em mim algum sinal de derrota. Aprendi com as plantas forrageiras do meu quintal que quando arrancadas já espalharam sementes e deitaram raízes para longe de caules e folhas. Plantas que as vezes parecem extintas, mas que depois da primeira chuva ou no fim do inverno, renascem e se alastram. E sempre haverá a próxima chuva, o próximo inverno e a próxima oportunidade.
Não nego que há possibilidade de morte pelo excesso de golpes. Mas sei também que as plantas se protegem e trabalham sem alarde, silenciosamente, compondo uma rede. Morrem aqui e nascem acolá.
Não esperem me ver derrotada frente ao descalabro. Antes declaro, sem mesuras, o meu orgulho de estar a esquerda das cenas lastimáveis, trazidas à público por uma casa que deveria nos representar.
Não me deixei derrotar depois de ver mais de trezentos parlamentares agindo como atores canastrões e repetindo justificativas patéticas, mal ensaiadas, que não enganariam nem aos próprios.
Antes, declaro sem medo, que enquanto eles descumpriam o segundo mandamento e tomavam o nome de Deus em vão, crescia a  minha convicção de que Deus é consciência plena, que as escolhas devem ser feitas em nome próprio e que o louvor só pode ser prestado mediante o exercício dos mandamentos.
Enquanto aqueles que deveriam proteger o país, jogam a nação aos predadores, em nome de suas religiões, declaro sem dúvidas, que se essa for a pratica de suas igrejas, prefiro orar no silêncio de meu quarto.
Não me coloquei derrotada depois da traição na votação das Diretas Já! E depois de assistir a essa nova traição, justificada pelas pessoas que se dizem “de bem”, com mentira de que atendem aos anseios populares, escolho estar à margem e aviso que nunca tiveram meu aval para falar em meu nome.
Não estive derrotada nem mesmo depois assistir um parlamentar acusado de inúmeros crimes, para quem a Procurador Geral da Republica pediu 184 anos de prisão, comandar um processo de impedimento. E também não estarei quando a mídia espúria do meu país gastar horas de seus noticiários e páginas de seus jornais e revistas com as denúncias sem provas, usadas para incitar a crença de que impedimento é necessário.  também não vou sucumbir frente a propaganda enganosa que pregou e pregará a ideia que a troca de presidente beneficiará o país,  quando,na verdade, atenderá apenas aos  interesses do grupo mais abastado do país. Isto, caso sobrevivam aos predadores que invadirão nosso território.
Não me coloco derrotada porque minha força independe das campanhas anti crença dessa mesma mídia. Sou imune a elas. Conheço seus artifícios e antes de dar-me ao desolamento, prefiro semear o que sei.
Não me deixo abater também por vivenciar a outra face do processo e o torno público. Meu ânimo tem vários motivos, mas destaco os principais. O primeiro foi verificar que aqueles que receberam meu voto o honraram. São parlamentares conscientes, conhecedores e respeitadores da Constituição Federal e capazes de denunciar as ações que a violam . São parlamentares que não precisaram submete-se, nem viver a sombra de mandantes espectrais.
Aqueles a quem confiei meu voto não pactuam com a entrega do solo e subsolo para as mesmas petroleiras que, em associação com a industria do armamento, dizimaram todo Oriente Médio e outros países em outros continentes.
Aqueles que escolhi para me representar fazem parte de um grupo não muito grande. No caso da Câmara Federal, o número não foi suficiente para barrar o golpe. Mas espero que sejam exemplo, que se multipliquem, que trabalhem incansavelmente para não deixar que os direitos trabalhistas sejam excluídos ou que as vozes das minorias seja caladas.
Tivemos um revés e temos o risco de que a situação se repita no Senado, mas não estive nem estarei derrotada, porque vivi esse processo em meio a uma multidão.  Pessoas, que mesmo perdendo a votação, continuavam a cantar “não vai ter golpe! ”
Uma multidão de gente de diferentes grupos sociais, das mais diversas vertentes culturais e diferentes idades, que seguiam a votação repudiando a farsa da maioria dos deputados e deputadas, com suas justificativas inventadas por algum marqueteiro medíocre que fez questão de inserir ideias expressas por Lula ao jornalista Glenn Greenwal. Uma multidão que comemorava cada voto contra o impedimentos e reforçava o voto de “vai ter luta!” Jovens, que de alienados não tem nada. Pessoas que com um terço de minha idade esbanja consciência.
Tenho esperança e a cada dia espalharei o que sei e buscarei o que meus parceiros sabem. Tenho esperança e a cada dia cuidarei das sementes e das raízes para que se alastrem e prevaleçam.

Não pensem que não tenho criticas ao governo do PT. Tenho muitas. De meu ponto de vista ocorreram erros e os principais foram de logística. Em 2005, quando os diversos grupos da velha mídia agiram em rede e atuaram sistemática e incansavelmente para minar o PT e, em particular àqueles que parecem, foram eleitos como os construtores das políticas de governo, nenhuma medida relevante foi tomada. Em pleno caos mundial, com o planeta a beira de um colapso ambiental e social,  a equipe de governo seguiu acreditando que o sistema capitalista tem jeito e pode atender as necessidades daqueles que não são donos dos meios de produção. Seguiu em rota de colisão com os próprios militantes, a maioria formados pelas ações nas bases do mesmo PT.

Mas se tenho críticas, também percebo que muito foi aprendido e que há chance de rever a rota. E se a equipe de governo entendeu que é necessário rever suas escolhas, os militantes, mesmo em desacordo com a gestão federal, entendendo o processo, se mantém em luta pelo estado democrático e pelo partido que criaram e ajudaram a crescer.

Também não imaginem que sou ingênua e que acredito que há partidos sem integrantes corruptos. Mas, se a corrupção no PT fosse sistêmica como querem nos fazer crer desde 2005,  com todo empenho de Lula,  o processo de impedimento estaria morto, soterrado sob negociatas. Mas o que assistimos e ainda estamos assistindo, prova exatamente o contrário.

 

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Viajando com “O Causo é o Seguinte”

abr 6, 2016 por

 

 

 

 

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Domingo ensolarado, 03 de abril de 2016, último dia de Festival de Teatro de Curitiba. Érico Viensci passeava com a filhinha entre as árvores do quintal palco do Ave Lola. Outras crianças exploravam o espaço enquanto os adultos iam se acomodando. Du Gomide transitava entre o quintal e o bar instalado na varanda, uns dez degraus acima. Daniel Farah passou por perto e sumiu. De longe era possível ver Richard Rebelo em plena concentração. Mais ou menos 11 horas os três músicos deixaram de circular entre plantas, almofadões e pessoas. Juntaram-se a Richard Rebelo. Algum tempo depois, ao som da música que tiravam dos instrumentos, os quatro desfilavam pela plateia, tomando o palco ao ar livre. O que tivemos, na sequencia, foi uma hora de viagem prazerosa por esse país de singularidades, contrastes e complementaridades.
O Causo é o Seguinte é definido em sua página, no Facebook, como “um espetáculo musical de contação de causos e modas de viola”. A afirmação é verdadeira, mas tem bônus. Tem rabeca, instrumentos de percussão, violão e até gaita (ou sanfona). Mas não imaginem três músicos e um contador de causo com papéis estanques. Os primeiros mergulham na contação através das letras e de intervenções que antecedem ou entremeiam as músicas que são, também, causos. O último, canta, toca triangulo e tira um bom som da gaita. E entre uma coisa e outra, tem a conversa com quem está do lado de lá – na plateia. E a plateia responde com alegria, porque é bom estar ali, participando da viagem.
Ainda na página citada, encontramos que “ o projeto revisita a história musical e literária brasileira: dos cordéis nordestinos, passeando pelo interior de Minas Gerais, às afinações e ponteios de viola do interior paulista”. Aí também tem bônus. Nesta versão os sons de Santa Catarina e Rio Grande do Sul estão presentes. E para tornar tudo isso um pouquinho mais gostoso, os causos são contados com sotaques bem trabalhados, sem exageros ou estereótipos e ganham cores com os movimentos e expressões do contador e dos parceiros. O Trio Caipora (Érico, Du e Daniel) e Richard encarnam um grupo de compadres proseando sob árvores e sobre bancos de uma praça, de alguma cidade de qualquer uma das regiões visitadas no espetáculo. Para quem possa não acreditar, basta ver a galeria de fotos que apesar do amadorismo da fotógrafa e das variações de luz e sombra proporcionadas pelo sol entre árvores, já é uma grande viagem.

(ao clicar na foto ela será selecionada. Clicando pela segunda vez ela abrirá em página inteira)

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Feira do Poeta: um ano de (re)conquistas

abr 1, 2016 por

imagem do acervo da Feira do Poeta

Os escritores sabem que seus escritos precisam de leitores e que leitores precisam de poesias e histórias através das quais possam viajar. Mas escritores também sabem que é preciso criar pontes entre suas criações e aqueles que as querem conhecer. Uma das boas pontes é a Feira do Poeta.
Para quem não conhece, a Feira ocupa um espaço não muito grande, mas aconchegante e bem organizado no Largo da Ordem. Durante décadas foi referencia, mas sumiu do cenário curitibano por cerca de 12 anos, ressurgindo em março de 2015.
Este núcleo nasceu em 1981 com o nome Projeto Poetas na Praça, desencadeado pela poetisa Maria de Jesus Coelho que queria um espaço para si e seus colegas. A Fundação Cultural de Curitiba atendeu a reivindicação e a FUNDEPAR ampliou o apoio, cedendo equipamentos para impressão artesanal. No final do mesmo anos nascia a Feira do Poeta.
Muita coisa aconteceu. A equipe apoiou, publicou e mostrou muita gente enquanto transitava por vários espaços, incluindo o Centro de Criatividade do Parque São lourenço, a Casa Romário Martins, a casa nº 108 da Rua Claudino dos Santos e ganhou sede própria, ao lado da Casa Romário Martins. Depois de tanto fazer, a Feira sucumbiu. Mas poesia é como aquelas plantinhas de raiz rasteira, que some aqui e aparece acolá. E reapareceu pelas mãos de Luiz Brizola3Carlos Brizola. Ele contou em entrevista que reabrir a Feira do Poeta foi uma ideia grupal. Veio à tona em meio a uma série de movimentos como o Cutucando a Inspiração, Sarau Popular, Escritibas e Meninas que Escrevem (atual Marianas). De posse da proposta, Brizola foi a Fundação Cultural de Curitiba que apoiou e ajudou a negociar a recuperação do espaço.
Nesta semana a reabertura da Feira do Poeta completou um ano, fortalecida pela participação coletiva. Tem nova forma de funcionar e presta apoio aos escritores de diferentes linguagens. É, principalmente, um espaço de divulgação para autores de Curitiba e região metropolitana. Mas está aberto aos músicos e outros artistas que queiram realizar performances e intervenções diversas. Além da disponibilização do espaço, presta serviço de orientação para editoração, apoio logístico aos Escritibas e aos projetos Sarau Popular e Cutucando a Inspiração.
A Feira do Poeta é hoje, a casa do escritor de Curitiba e região, mas para lançamentos e eventos, recebe autores de qualquer lugar do Brasil.
Os domingos são reservados aos lançamentos e manhãs de autógrafos. Entre terça e sexta, além do apoio logístico já citado, é possível fazer consulta ao acervo, obter informações e consultoria para editoração.
Até fevereiro de 2016 contava com a coordenação apenas de Brizola, mas partir de março de 2016, Geraldo Magela passou a integrar a equipe. Magela, que está na foto da antiga Feira do Poeta, é quem a define como “espaço plural, com várias linguagens, literárias ou não”. FP11

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Mantra do Luto em Primeira Pessoa

mar 22, 2016 por

Tudo que alcanço tem um toque de mentira, outro de verdade;
uma dose de franqueza, outra de falsidade;
uma parte de loucura, outra de sanidade.

O mantra era companhia de muitas horas. Revia os anos, revirava a história.

Um dia me perdi do que era e andei à deriva, tentando reaver o rumo. Coisa idiota para pensar às portas da velhice.
Talvez fosse idiotice, mas o sono entrecortado sangrava a trajetória. Na encruzilhada, quase mulher, quase menina, errou a estrada. Ou seria essa a única alternativa?

Um dia me perdi do era. Mas qual dia? Naquele em que ouvi uma palavra desconhecida que nomeava uma profissão impensada e entendi que aquela era minha sina? Foi loucura, disparate, alucinação ou guia?
Talvez puro disparate, mas foi o que fez. Decidiu naquele instante, num banco de escola e no decorrer dos anos seguintes deixou morrer sua arte para seguir o destino.

Um dia me perdi do que era, mas qual dia? Naquele em que o medo pautou a atitude e, no lugar de correr ao encontro do afeto, fingi, dissimulei e menti? Deveria ser simples, sem temores, mas parecia amedrontador dizer venha, eu quero.
Talvez medo do amor, medo da dor, da frustração. Dissociou ali, naquele momento de insegurança e, no decorrer da vida seguiu irresoluta, sem dissolver a própria ambiguidade.

Um dia me perdi do que era, mas qual dia? Talvez naquele em que o corpo pulsava com desejo intenso, mas deixei que regras gritassem a decisão. Memória estúpida, que traz à tona sentimentos tão bem embalados e acomodados.
Talvez imensa estupidez, mas foi naquele momento, entre beijos e ternuras, que entortou a vida. Depois seguiu sem rumo, preenchendo vazios com emoções menores.

Um dia me perdi de mim. Mas qual dia. Talvez naquele em que experimentei o risco, achei forças para a violência e nela me fiz cactus. Foi como cactus que sobrevivi e salvei os sonhos que ainda trago em mim. Armar-se de guerra é insensatez, se a armadura torna-se pele.
Talvez seja insensatez ser cactus vida à fora, desconsiderando a seiva que os espinhos guardam. Mas foi o que fez. Defendeu-se de tudo e de todos até que outro cactus foi espelho para o seu.

Tudo que alcanço tem um toque de mentira, outro de verdade
uma dose de franqueza, outra de falsidade;
uma parte de loucura, outra de sanidade.

O mantra interrompeu o curso da história. Todos os momento, a um só tempo, tomaram o presente. E no presente nada havia além das fugas.

Estou de luto. Esquisitice afirmar que é o mais intenso e inconfessável dos lutos. Mais profundo e silencioso que qualquer um dos outros, vividos quando pessoas amadas partiram.
Talvez volte a ensimesmar para depois retomar a armadura. Mas agora estou cansada da luta, da labuta, cansada de guerrear. Tenho sono, vontade de estar fora do mundo, de descansar. Entre imagens, visagens e memórias quero o desligamento, a plenitude sem fantasias e sem promessas. Principalmente sem as promessas vazias, que reconheço no mantra:

Tudo que alcanço tem um toque de mentira, outro de verdade;
uma dose de franqueza, outra de falsidade;
uma parte de loucura, outra de sanidade.

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Desculpa

mar 19, 2016 por

Há poemas que nos falam a alma e nos acompanham anos ou décadas. Desculpa, de Maurício Távora está nesta minha lista. Não sei se o autor teve outros livros publicados. Conheço um pouco de sua história no teatro, em Curitiba, mais especificamente, no Guaira.

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Os loucos que me perdoem,
mas a distância é fundamental.

Não é, Poeta?

E se ela está num copo de uisque,
melhor, é mais legal,
com garantia constitucional.

 

Os loucos que me perdoem,
mas o mais-que-perfeito,
esse que não se arrisque
e evite sempre ficar por perto.
Que apague o olhar pretensamente esperto
e vá dar voltas na avenida,
de paletó e gravata.
E que não esqueça a graxa
no sapato, o perfeito nó em cada pé,
o sorriso de lata, a barba feita –
esquerda, direita, esquerda, direita!
Felicidades migo.
Desculpa não ir contigo,
mas acontece que não vais mais,
desde aquele dia que descobristes
o gostoso costume antigo
de ficar.
De ficar – como se diz? – de ficar bem.

Os loucos que me perdoem,
sinceramente,
se com eles não consigo ir também.

Maurício Távora
de VOAVIDA Poesias

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