DE ONDE SOU?
Do lugar onde moro posso ver o Pico Paraná atracado à cadeia de montanhas que cerca a baía. Também posso acompanhar o sol pintando o céu em cores não encontradas nos mostruários de tinta, enquanto se esconde atrás dos morros. Ainda ontem emprestou às bordas das nuvens um alaranjado cintilante e ao céu, o rosa, o lilás e o azul.
Nas tardes de outono o vento faz tremular a superficie da água do mar de mangue, onde aportam os barcos dos pescadores da região.
O mar do lugar onde moro não explode em ondas volumosas e barulhentas. Apenas obedece ao tempo de cada maré e avança sobre a vegetação que o contorna para depois recuar, deixando à mostra os buracos dos caranguejos.
Mas, apesar do deleite, confesso: não sou daqui.
De onde sou?
Creio que nos últimos anos uma centena de pessoas, ou mais, quis saber de onde sou. Passado o momento do desacerto, recorro à história oficial e respondo que sou do norte do Paraná. As vezes faço referencia a cidadezinha agricola, que hoje tem ruas asfaltadas, mas que no tempo de minha infância eram de pó ou barro vermelho e grudento. Descartada a resposta oficial, diria: sou de lugar algum. Experimentei cidades e vilas, experimentei jeitos de viver, aprendi coisas aqui e acolá, mas em apenas dois lugares não me senti exilada: na Ilha do Mel e na região do Andes, entre La Paz e Machu Pichu. De resto, sempre fui estrangeira em meu país.
Dia desses passei um final de semana numa “vila rural”. A terra, as plantações, os agricultores nas suas lavouras quando o sol ainda tentava furar a névoa, as familias extensas no entorno da longa mesa de uma ampla cozinha, a simplicidade, os valores claros e os vínculos firmes içaram o que sou.
Continuo sendo de lugar algum, mas sei que em meio ao alvoroço do mundo, há aqueles a quem me assemelho.
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